A primeira leitura da liturgia da palavra deste domingo narra a dura prova a que foi submetido o Patriarca Abraão.  “Recusando o sacrifício de Isaac, Deus se alegra com a total disponibilidade de Abraão. Deus não exige sacrifício sangrento, ele nos pede a entrega total ao seu amor de pai, Ele pede a fé que é a entrega cheia de confiança, de nossa vida, em suas mãos. Se Deus não exigiu de Abraão o sacrifício do seu Filho, ele entregou por nós o seu Filho não como um pai cruel e indiferente, mas como um Pai que respeita a decisão livre de seu Filho de ir até ao extremo do amor para salvar a humanidade.”  A história de Isaac mostra que Deus nunca abandona seus projetos de vida para os homens.

Paulo, na carta aos Romanos, faz uma leitura do sacrifício de Isaac à luz do sacrifício de Cristo e afirma que Deus, ao contrário, não poupou o seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós. Ele amou tanto o mundo que nos enviou seu  Filho unigênito que morreu  por nós, ressuscitou  e está sentado à direita do Pai e intercede por nós. Por meio do sacrifício de Jesus Cristo é que Deus nos salvou. Como a Abraão e ao apóstolo Paulo, nos tocam, muitas vezes,  momentos difíceis de sofrimentos, de cruz, mas a certeza de que Deus nos ama e está conosco nos fortalecerá e nos ajudará a não recuar no caminho da fé. “Se Deus está por nós, quem estará contra nós?”

No evangelho, Marcos descreve a experiência de Pedro, Tiago e João, da transfiguração de Jesus, no alto de um monte. No meio das nuvens, ouvem uma voz que diz: “este é o meu Filho amado. Escutai o que Ele diz”. Jesus, ao mostrar o esplendor de sua glória aos apóstolos,  quis mostrar-lhes que a paixão é o caminho da ressurreição. Antes de sua paixão e morte, Jesus quis deixar claro aos três apóstolos que ele é Deus para que  tenham isto presente durante a sua paixão. Esta experiência permitiu aos apóstolos antever o final glorioso da paixão e morte de Jesus, mas eles deverão antes escutar  e seguir o Mestre até a paixão e morte de cruz. A nossa vida não é só feita de tristezas, sofrimentos. Cada um de nós experimenta também momentos de transfiguração, isto é, momentos de maior alegria, contentamento e paz. Saibamos agradecer a Deus esses momentos que Ele nos concede.

O tempo da quaresma nos convida a aprofundar-nos  no amor de Deus para conosco por meio da contemplação amorosa da cruz. Uma das práticas piedosas do povo cristão neste tempo é o exercício da Via-Sacra. A meditação da paixão e morte de Jesus através das estações da Via-Sacra nos enche de paz, serenidade, esperança, amor e perdão.

Os romeiros que vem a Aparecida não deixam de ir ao Morro do Cruzeiro. Hoje se pode ir de teleférico, mas muitos sobem a pé, o morro,  com sacrifício, meditando e rezando, diante dos quadros da Via-Sacra. É certamente, um momento de graça para todos os romeiros, sobretudo, neste tempo da quaresma. Você pode fazer este exercício de piedade também em sua paróquia ou comunidade e até mesmos em casa ou rezar o terço, meditando, principalmente, neste tempo de quaresma, os mistérios dolorosos.

Da contemplação serena da paixão de Cristo, brotará, certamente, um desejo profundo  de ajudar o irmão sofredor que está próximo de nós.

“Eu vim para servir” é o lema da CF deste ano. É a resposta de Jesus aos discípulos quando se perguntavam quem seria o maior no reino  que Jesus  iria instaurar. Foi uma  oportunidade para Jesus lhes dar uma lição sobre o poder como serviço. Que a CF deste ano nos ajude a assumir o compromisso concreto e efetivo na construção de uma sociedade mais justa, fraterna e pacífica de acordo com a responsabilidade que cada um tem no ambiente onde vive e trabalha.

Aproveitemos também deste tempo quaresmal para experimentar a misericórdia, o perdão, o amor de Deus no sacramento da penitência, para recuperar a graça divina e nos fortalecer no combate contra o pecado, contra o mal.

Dom Raymundo Damasceno Assis
Cardeal-Arcebispo de Aparecida, SP