Com a missa vespertina da Ceia do Senhor, abre-se o Tríduo Sagrado que nos introduz na dinâmica do mistério pascal de Cristo: a passagem da morte para a vida gloriosa do Ressuscitado.

Na primeira leitura tirada do livro do Êxodo, o texto descreve como os judeus celebram a sua páscoa, cada ano, para fazer memória da sua libertação do Egito. A Páscoa para os judeus é memória da passagem de Javé que livra as casas dos israelitas da morte dos primogênitos e da passagem do Mar Vermelho atravessado milagrosamente.

Nós cristãos, celebramos a páscoa de Cristo, a sua passagem da morte na cruz para uma nova vida.

Na ceia pascal de Quinta-Feira Santa, Jesus instituiu a Eucaristia. Nessa ceia, com os seus apóstolos, Jesus tornou presente, sacramentalmente, nos sinais do pão e do vinho, sua oferta ao Pai pela salvação de todos nós. “Isto é o meu corpo, que será entregue por vós”. “Este é o meu sangue da nova e eterna aliança, que será derramado por vós, para a remissão dos pecados.”

Jesus instituiu a Eucaristia que é a atualização do seu sacrifício, memorial de sua morte e ressurreição e  São Paulo recordará esta verdade aos Coríntios: “Todas as vezes, de fato, que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, estareis proclamando a morte do Senhor, até que ele venha”  (I Cor 11,26). É também a renovação da Ceia do Senhor, com os seus apóstolos, na qual ele nos dá o seu Corpo e o seu Sangue como alimento de vida eterna.

A Eucaristia é também sacramento da presença real do Cristo ressuscitado entre nós, para ser visitado, adorado e glorificado por nós e ser levado aos enfermos e idosos impossibilitados de participar da celebração eucarística. Por isso, no final da nossa celebração, a sagrada Eucaristia será levada em solene procissão até a Capela do Ssmo. Sacramento para a nossa adoração.

Na Quinta-Feira Santa, juntamente com a Eucaristia, Jesus instituiu o ministério sacerdotal.

Ao dizer aos apóstolos: “Fazei isto em memória de mim”, Jesus quis ter a necessidade de homens que, chamados por Deus e  consagrados pelo Espírito Santo, agissem em união íntima com a sua pessoa, para perpetuar, no tempo e no espaço o memorial de nossa redenção na celebração da Eucaristia e para distribuir aos que se aproximassem da mesa do Senhor, o alimento de vida eterna.

Hoje é um dia especial não só para agradecer o tesouro da Eucaristia, fonte e cume da vida cristã, mas também para agradecer e rezar pelos  presbíteros e pedir a Deus pelo aumento das vocações sacerdotais.

Dom e mistério é o sacramento do altar, dom e mistério é também o sacerdócio, tendo surgido os dois, a eucaristia e o  sacerdócio, do Coração de Cristo durante a Última Ceia” (João Paulo II)

No evangelho de João, a instituição da Eucaristia não é evocada explicitamente, mas João coloca durante a ceia, no lugar da instituição da Eucaristia, um gesto simbólico que dá o sentido da eucaristia e define toda a vida de Jesus. Jesus se ajoelha e lava os pés dos discípulos.  No tempo de Jesus, o costume de lavar os pés era um gesto de acolhida, de hospitalidade. Os escravos lavavam os pés dos seus senhores, as mulheres os do seu marido, as crianças os de seus pais. No Evangelho, como escutamos, Jesus realiza este gesto durante a ceia e é ele o Senhor que o realiza,  não o escravo.

A cena do Lava-pés, ao lado da cruz, expressa  a doação de si mesmo que Jesus faz à humanidade na Eucaristia. Ao substituir a narração da Eucaristia pelo lava-pés, São João mostra-nos que a Eucaristia ao nos unir a Cristo, deve levar-nos também a solidariedade com os nossos irmãos, sobretudo os mais pobres. Comungar o Cristo, é comungar com o irmão.

É impossível separar  a Eucaristia do sacrifício ministerial como também, é impossível separá-la do amor fraterno. A entrega total de Cristo na Última Ceia pede de todo discípulo seu que se coloque a serviço do irmão mais necessitado. “Se eu,  Senhor e mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz”   (Jo 13, 13-15).

Dom Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo Metropolitano de Aparecida